Por que você não entende os nativos: a redução de palavras

Grupo de amigos sentados sobre gramado fazendo um piquenique à frente de árvores altas parecem estar conversando e se divertindo.

Existe um fenômeno característico da língua inglesa que acontece na fala dos falantes nativos de provavelmente todas as suas variantes, mas que é muito ignorado por quem aprende inglês como segunda língua. Esse fenômeno é a redução de palavras.

Não dominar essa característica é um dos grandes motivos que impedem você de entender o que os nativos falam e de falar com mais naturalidade para que eles compreendam melhor o que você comunica.

Para entender melhor essa característica do inglês, a gente vai discuti-la ao longo deste texto.

Que fenômeno do inglês é esse?

Esse fenômeno é conhecido pelo termo “redução de palavras”, mas, na verdade, compreende diversos processos fonológicos típicos da língua, entre eles o enfraquecimento e a eliminação de sons. Embora também aconteça com as consoantes, a redução afeta mais notoriamente as vogais.

O que é a redução de palavras?

Em todas as línguas existentes, a fala acontece por meio da combinação de sons em uma sequência, uma ordem, já que só somos capazes de produzir um som após o outro. E é a essa sequência que atribuímos um significado.

Quando nosso ouvinte escuta esses sons nessa determinada ordem, ele reconhece a sequência, recupera o significado atribuído a ela e compreende o que estamos dizendo.

Em português, por exemplo, temos os sons das vogais [a] e [ʊ] e da consoante [m]. Isoladamente, eles não representam nada para nós nativos; são apenas sons no espaço. Porém, se combinados na ordem certa, podem apresentar um significado.

Se dispostos na ordem [aʊm], ainda não dizem nada (a não ser que você goste de mantras). Mas, se colocarmos a consoante no início, teremos a sequência de sons [maʊ] que forma a palavra “mau”. Assim, vamos combinando sons, que vão formando palavras, e palavras que vão constituindo frases e assim por diante.

Em algumas línguas, é importante que os sons dessas sequências tenham (quase) sempre a mesma qualidade, independentemente de onde eles apareçam, como é mais ou menos o caso do espanhol, do japonês e do português brasileiro. Já para outras línguas, como o português lusitano e o inglês, não é preciso pronunciar todos os sons com a mesma qualidade sempre. Inclusive, no inglês, fazer isso pode até dificultar o entendimento e, assim, a comunicação, uma vez que as palavras não reduzidas podem comunicar uma mensagem diferente.

É aí que chegamos à redução das palavras. Ela geralmente acontece por meio da alteração de determinados traços dos sons, o que acaba por transformá-los em outros, ou a completa eliminação desses sons, o que pode transfigurar inteiramente as palavras. Isso acontece por motivos diversos, como mudanças fonéticas já em curso na língua, frequência de uso de determinadas palavras ou frases, mensagem que o falante quer transmitir, uso discursivo de algumas frases etc.

Isso significa dizer que as palavras do inglês podem ter mais de uma pronúncia. Ao serem pronunciadas isoladamente, apresentam uma pronúncia que pode ser totalmente diferente de quando estão dentro de uma frase.

É por isso que, se você não faz isso ao falar inglês ou não está familiarizado com isso, é difícil para os nativos lhe compreenderem e para você compreendê-los.

Como a redução acontece?

Embora explicar dessa forma faça parecer, a redução de sons não acontece de forma aleatória. Isso porque, quando nos comunicamos, é preciso que o ouvinte também reconheça algum padrão nos sons que emitimos para dizer algo, com ou sem redução. Caso contrário, ele não entenderia nossa fala. Esse é um dos motivos, por exemplo, que nos impede de entender outra língua: precisamos conhecer os padrões significativos (palavras).

No inglês, aplica-se uma regra geral baseada em uma divisão das palavras da língua: palavras gramaticais (function words ou grammatical words) e palavras lexicais (content words ou lexical words).

Resumidamente, as primeiras são palavras que não apresentam um conteúdo, mas funções gramaticais: the, of, because, this, etc.; elas ajudam a organizar os textos e as sentenças e fazem referências internas. Já as segundas são aquelas que apresentam conteúdo próprio, pois aludem ao mundo real: house, golden, run, slowly, two, ente outras. Segundo essa regra, enquanto palavras gramaticais quase sempre são reduzidas, palavras lexicais geralmente não sofrem redução.

Se elas não sofrem redução, significa que seus sons são preservados. Porém, falando mais especificamente, são as sílabas tônicas (stressed syllables) dessas palavras que tem seus sons inalterados. Já as sílabas átonas, aquelas pronunciadas com pouco ou nenhum destaque, são as que sofrem as alterações necessárias, mesmo em palavras lexicais.

Como a vogal é o som que sustenta a sílaba e forma seu núcleo, é ela que geralmente tem a qualidade preservada ou alterada. Os sons vocálicos são reduzidos para uma vogal conhecida como “schwa” [ə]. O “schwa” é um som produzido de forma mais relaxada, quase sem movimento da língua, e é a vogal mais abundante do inglês.

Em alguns casos, as vogais também podem ser eliminadas. Exemplos disso são as palavras comfortable [ˈkʰʌɱftəbəl], que é pronunciada sem enunciar o “or” da sílaba “for”, em comparação a comfort [ˈkʰʌɱfəɹt]; e difference [ˈdɪfɹəns], em que o som do “e” da sílaba “fer” é retirado, em comparação a differ [ˈdɪfəɹ].

De modo geral, as consoantes também passam por algum tipo de redução: assim como as vogais, ou são transformadas em outro som consonantal, ou são eliminadas completamente. Por exemplo, o som de “t” [t] ou “d” [d] que inicia uma sílaba átona é reduzido para um som conhecido em inglês como “tap” ou “flap” [ɾ] quando aparece entre duas vogais (redução da duração do som). Esse é um som similar ao do “r” do português nas palavras “arara” ou “para”. No inglês, acontece em palavras como “water” [ˈwɔɾəɹ], “bottle” [ˈbɑɾɫ] e “united” [jʊˈnaɪɾɪd].

Já a palavra “have” [ˈhæv], a depender do contexto, pode ter o som de “h”, ou os sons de “h” e de “v”, eliminado — e as vogais são mudadas para o “schwa”; e o “d”, para um “tap”. Isso acontece, por exemplo, na estrutura “should have” [ˈʃʊdˈhæv], que significa “deveria ter”. Ela é comumente pronunciada como shouldav [ˈʃəɾəv], principalmente antes de palavra iniciada com consoante vozeada (b, m, d, z, j, g, entre outras) ou shoulda [ˈʃəɾə], principalmente antes de palavra iniciada com consoante desvozeada (p, t, s, k etc.).

O que determina a redução de palavras?

Como já visto, existe uma regra geral para que a redução de palavras aconteça no inglês. Enquanto as palavras gramaticais são reduzidas, as lexicais são conservadas. No entanto, outro fator que pode impedir a redução de uma palavra é a mensagem que o falante quer transmitir.

Explicando de forma simplificada, de acordo com o significado que esse falante pretende passar em sua fala, algumas palavras podem receber um destaque maior na frase, o que é conhecido em inglês como sentence stress (acento frasal). As sílabas tônicas dessas palavras serão pronunciadas com maior clareza, tonicidade, volume e duração que a de outras, até mesmo lexicais. Porém, a depender da intenção, até mesmo uma palavra gramatical pode ser pronunciada com essas características sobre a de outras.

Por outro lado, em certos casos, palavras que seriam pronunciadas com destaque podem ser reduzidas. Isso tende a acontecer quando palavras lexicais passam a ser usadas com uma função diferente, como funções gramaticais ou discursivas (que organizam o discurso).

A redução das palavras em inglês é um fenômeno que permeia toda a língua. Além de muito amplo, pois envolve todos os âmbitos da língua, é também complexo, já que engloba vários processos fonológicos e fonéticos. Ela afeta os sons e os padrões de pronúncia e é também impulsionada por questões gramaticais, discursivas, interacionais.

Por esse motivo, conhecer e incorporar a redução das palavras à sua fala é essencial para você compreender e ser compreendido sem dificuldades. Você não precisa conhecer todas essas questões linguísticas para chegar ao seu objetivo de falar inglês melhor, inclusive não só porque esse é o trabalho da linguística como também porque há aspectos que a própria ciência das línguas ainda desconhece e está constantemente investigando. Porém, você pode descobrir quando deve usar as reduções (como no caso da regra geral) e o que fazer com os sons das palavras para reduzi-los.

Para saber mais sobre esse assunto, continue lendo nossos artigos.

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